Toxoplasmose na gravidez é uma condição que pode gerar dúvidas, insegurança e, principalmente, riscos reais para o bebê se não for diagnosticada e tratada corretamente. Neste guia completo, você entenderá quando o tratamento é realmente necessário, como identificar uma infecção recente e quais cuidados devem ser tomados para garantir uma gestação segura e saudável.
O que é toxoplasmose?
A toxoplasmose é uma infecção causada pelo protozoário Toxoplasma gondii. Apesar de, em pessoas saudáveis, geralmente passar despercebida, ela representa um risco significativo quando ocorre durante a gravidez, especialmente para o feto em desenvolvimento. A transmissão é comum e pode ocorrer de formas variadas, tornando a prevenção essencial durante o pré-natal.
Causa e transmissão
A infecção ocorre principalmente pela ingestão de alimentos contaminados com oocistos do parasita — como carnes cruas ou mal cozidas, frutas e vegetais mal higienizados — ou pelo contato direto com fezes de gatos infectados. Também pode ocorrer, mais raramente, por transfusão de sangue ou transplantes.
Ciclo do parasita
Toxoplasma gondii
O ciclo de vida do Toxoplasma gondii envolve hospedeiros intermediários (como humanos, aves e outros mamíferos) e o hospedeiro definitivo, que são os felinos. Após a infecção, o parasita pode permanecer em forma latente nos tecidos, especialmente músculos, cérebro e olhos. Em situações especiais, como a gestação, ele pode atravessar a placenta e afetar diretamente o feto.
Gravidez e riscos da toxoplasmose congênita
Por que a toxoplasmose é perigosa na gestação?
Durante a gestação, a toxoplasmose na gravidez pode ser transmitida da mãe para o bebê pela placenta, condição chamada de toxoplasmose congênita. Essa forma da doença pode gerar sérias complicações para o bebê, como lesões cerebrais, oculares, microcefalia, hidrocefalia, calcificações intracranianas, retinocoroidite e até mesmo levar à perda gestacional.
Quando o feto pode ser afetado?
O risco de transmissão vertical varia conforme o trimestre da gestação. Nos primeiros três meses, o risco de transmissão é menor (cerca de 10-15%), mas as complicações tendem a ser mais graves. No terceiro trimestre, a taxa de transmissão pode chegar a 60-80%, embora os efeitos no feto tendam a ser mais leves ou até mesmo assintomáticos ao nascimento.
Sintomas da toxoplasmose na gestante
Casos assintomáticos e casos sintomáticos
A maioria dos casos de toxoplasmose na gravidez é assintomática, o que torna a sorologia pré-natal fundamental para o diagnóstico precoce. Em alguns casos, a infecção pode causar sintomas inespecíficos, semelhantes aos de uma virose leve: febre baixa, dor de cabeça, fadiga, dores musculares e aumento dos linfonodos cervicais (ínguas).
Justamente por essa apresentação silenciosa, a triagem sorológica é considerada parte essencial do acompanhamento obstétrico, principalmente em gestantes que ainda não possuem imunidade comprovada.
Diagnóstico da toxoplasmose na gravidez
Sorologia (IgG, IgM e teste de avidez)
O diagnóstico da toxoplasmose na gravidez é feito principalmente por meio de exames de sangue que identificam os anticorpos IgG e IgM. A presença de IgG indica exposição prévia ao parasita, enquanto o IgM sugere infecção recente ou em curso.
Em caso de IgM positivo, é essencial realizar o teste de avidez do IgG, que mede a força com que o anticorpo se liga ao antígeno. Um resultado de alta avidez geralmente indica infecção antiga (antes da gestação), enquanto baixa avidez sugere infecção recente e potencial risco para o bebê.
Testes confirmatórios e papel do infectologista
Quando os resultados sorológicos são indeterminados ou há suspeita de infecção recente, o infectologista atua em conjunto com o obstetra para orientar a investigação. Testes confirmatórios podem incluir exames moleculares, como PCR no líquido amniótico (após a 18ª semana), que ajudam a detectar se houve transmissão para o feto.
O papel do especialista é fundamental para interpretar corretamente os exames e definir a necessidade e o momento do tratamento.
É preciso tratar toxoplasmose na gravidez?
Riscos do não tratamento
Sim, é necessário tratar. Se a infecção for recente e não for tratada, o risco de transmissão para o feto aumenta consideravelmente. Além disso, há maior chance de complicações neurológicas e oftalmológicas graves para o bebê, especialmente em infecções no primeiro e segundo trimestres.
O tratamento tem como objetivo reduzir a carga parasitária no organismo da mãe e impedir a passagem do parasita pela placenta. Quanto mais precoce for a intervenção, maiores as chances de proteger o bebê.
Quando o tratamento é indicado?
O tratamento é indicado quando há suspeita ou confirmação de infecção aguda durante a gestação — ou seja, quando os exames mostram IgM positivo com avidez baixa ou indeterminada, ou quando o PCR fetal confirma infecção congênita. Em casos de infecção antiga, comprovadamente anterior à gravidez, o tratamento não é necessário.
Como é feito o tratamento da toxoplasmose na gravidez?
Medicamentos utilizados
O esquema terapêutico varia conforme o momento da gestação e a confirmação ou não de transmissão para o feto.
- Se não há confirmação de infecção fetal: utiliza-se geralmente a espiramicina, um antibiótico seguro que atua como profilaxia fetal, reduzindo o risco de transmissão.
- Se há confirmação ou forte suspeita de infecção fetal (PCR positivo): usa-se uma combinação de sulfadiazina, pirimetamina e ácido folínico, mais potente e voltada para tratar a infecção congênita.
Duração e monitoramento
O tratamento pode durar várias semanas ou até o final da gestação, com monitoramento constante de exames laboratoriais e ultrassonografias obstétricas especializadas. É fundamental manter acompanhamento conjunto com o infectologista e o obstetra.
O que muda se a infecção for antiga vs. recente?
A interpretação correta dos exames sorológicos é fundamental para diferenciar uma infecção antiga (adquirida antes da gravidez) de uma infecção recente (adquirida durante a gestação). Essa distinção é crucial, pois apenas as infecções adquiridas durante a gestação oferecem risco de transmissão para o feto.
Se a gestante apresenta IgG positivo e IgM negativo, trata-se de infecção passada, e não há necessidade de tratamento. Por outro lado, IgM positivo com IgG de baixa avidez indica infecção recente — situação que exige intervenção imediata. Casos com avidez intermediária ou inconclusiva devem ser acompanhados com mais exames e avaliação especializada.
Quando o bebê precisa ser tratado ainda na barriga?
Em casos de toxoplasmose na gravidez com confirmação de infecção fetal, o bebê pode precisar ser tratado ainda durante a gestação. Isso ocorre geralmente após a realização do PCR no líquido amniótico, colhido por amniocentese a partir da 18ª semana de gestação.
Se o resultado for positivo, indica que o feto foi infectado e, portanto, o esquema terapêutico mais completo (com sulfadiazina, pirimetamina e ácido folínico) será necessário. A introdução precoce dessa combinação pode reduzir significativamente a gravidade das manifestações clínicas no nascimento.
Além disso, ultrassonografias seriadas ajudam a monitorar possíveis sinais de complicações, como calcificações cerebrais, ventriculomegalia ou aumento do fígado e baço.
Qual o risco de transmitir para o bebê?
A chance de transmissão vertical da toxoplasmose varia de acordo com o trimestre da gestação em que a mãe foi infectada.
- No primeiro trimestre, o risco de transmissão é menor (em torno de 10 a 15%), mas os efeitos sobre o feto tendem a ser mais graves, incluindo malformações do sistema nervoso central e oculares.
- No segundo trimestre, o risco sobe para cerca de 25 a 30%, com possibilidade de manifestações neurológicas e visuais moderadas.
- No terceiro trimestre, o risco pode chegar a 60 a 80%, embora os recém-nascidos sejam muitas vezes assintomáticos ao nascer — podendo desenvolver complicações oculares tardiamente, como retinocoroidite.
Esses dados reforçam a importância do diagnóstico precoce e do início imediato do tratamento para proteger o bebê.
O que acontece se a mãe não tratar a toxoplasmose?
Quando a toxoplasmose adquirida durante a gestação não é tratada, o risco de transmissão para o bebê aumenta significativamente. Isso pode resultar em quadros de toxoplasmose congênita, que variam desde manifestações leves até complicações graves e irreversíveis. Assim como em outras infecções tratadas na prática clínica, como as complicações da dengue, a abordagem precoce faz toda a diferença no prognóstico do paciente.
As possíveis consequências incluem alterações neurológicas como hidrocefalia, calcificações intracranianas, atraso no desenvolvimento psicomotor, além de lesões oculares que podem comprometer a visão ao longo da vida. Em alguns casos, há risco de aborto espontâneo ou morte fetal.
Por isso, mesmo quando a gestante está assintomática, a detecção de uma infecção recente exige avaliação e tratamento imediato.
O tratamento tem efeitos colaterais?
Sim, como qualquer tratamento medicamentoso, os medicamentos utilizados para toxoplasmose na gestação podem causar efeitos colaterais, embora sejam geralmente bem tolerados sob acompanhamento médico.
A espiramicina costuma ter um bom perfil de segurança e é bem aceita pelas gestantes. Já o esquema com sulfadiazina e pirimetamina, usado nos casos de infecção fetal confirmada, pode causar náuseas, vômitos, alterações hematológicas e reações cutâneas.
Por isso, é fundamental que esse tratamento seja conduzido por um infectologista em conjunto com o obstetra, com acompanhamento laboratorial frequente e uso concomitante de ácido folínico para proteger contra os efeitos adversos hematológicos.
Como prevenir a toxoplasmose na gravidez?
A prevenção é a principal estratégia para evitar a toxoplasmose congênita. O CDC (Centers for Disease Control and Prevention) orienta que gestantes redobrem os cuidados com alimentos crus, higienização e contato com gatos durante toda a gravidez.
Algumas medidas simples e eficazes devem ser adotadas durante toda a gestação:
- Evitar o consumo de carnes cruas ou mal cozidas (como carpaccio, carne mal passada ou embutidos crus)
- Lavar bem frutas, legumes e verduras antes do consumo
- Utilizar utensílios separados para carne crua e alimentos prontos
- Higienizar as mãos e as superfícies de preparo dos alimentos com frequência
- Evitar o contato direto com fezes de gatos, principalmente em caixas de areia
- Usar luvas ao mexer com terra ou jardinagem
Gestantes que convivem com gatos não precisam abandoná-los, mas devem evitar o manuseio direto da caixa de areia e reforçar os cuidados de higiene.
Quando consultar um infectologista?
O acompanhamento com um infectologista é essencial sempre que houver suspeita ou confirmação de toxoplasmose na gestação. Em situações similares, como ocorre em mulheres vivendo com HIV, o cuidado integrado com especialistas garante melhores resultados durante o pré-natal — conforme abordado no artigo Engravidar Vivendo com HIV: Cuidados e Considerações.
Este especialista é o profissional mais indicado para interpretar corretamente os exames sorológicos, orientar os testes complementares e indicar o tratamento mais seguro conforme o estágio da gestação e a possibilidade de infecção fetal.
Além disso, o infectologista atua em conjunto com o obstetra para definir o melhor plano terapêutico e garantir o monitoramento adequado da gestante e do feto, ajudando a prevenir complicações graves.
Consultar um especialista não apenas aumenta a segurança do tratamento, como também proporciona maior tranquilidade à gestante e à equipe de saúde envolvida no pré-natal.
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Acompanhamento do bebê após o nascimento
Mesmo com tratamento adequado durante a gestação, o bebê que nasceu de uma gestante com toxoplasmose deve ser avaliado cuidadosamente após o parto.
Esse acompanhamento envolve exames clínicos, laboratoriais e de imagem para detectar sinais de infecção congênita, como alterações neurológicas ou oculares. Muitas vezes, são solicitados exames de sangue específicos, ultrassonografia transfontanela e fundo de olho.
Nos casos em que a infecção congênita for confirmada, o bebê pode precisar de tratamento com medicamentos por até 12 meses após o nascimento, além de acompanhamento regular com infectologista pediátrico, neurologista e oftalmologista.
Conclusão
A toxoplasmose na gravidez é uma infecção que pode trazer sérios riscos se não for corretamente diagnosticada mas quando diagnosticada e tratada precocemente, a maioria dos casos evolui de forma segura tanto para a mãe quanto para o bebê.
O tratamento da toxoplasmose na gravidez é necessário sempre que houver infecção recente, e sua condução deve ser feita com apoio de um infectologista experiente.
O blog do Dr. Cesar oferece uma variedade de conteúdos educativos sobre infecções que podem afetar a gestação e a saúde sexual como um todo — confira mais em nosso Blog de Infectologia.
Além disso, medidas de prevenção são altamente eficazes e devem ser reforçadas desde o início do pré-natal.
O acompanhamento médico especializado é a chave para reduzir os riscos de transmissão e garantir um desfecho saudável para a gestante e seu filho.
Perguntas Frequentes (FAQ)
1. Toda gestante com toxoplasmose na gravidez precisa tratar?
Não. Apenas as gestantes que apresentam infecção recente (adquirida durante a gestação) precisam de tratamento. Casos com infecção antiga comprovada, adquirida antes da gravidez, não oferecem risco ao feto e, portanto, não requerem tratamento. O acompanhamento médico é fundamental para avaliar cada situação.
2. A toxoplasmose pode causar aborto?
Sim. Quando adquirida no primeiro trimestre da gestação, a toxoplasmose pode aumentar o risco de aborto espontâneo, morte fetal ou causar malformações graves no bebê. O diagnóstico e tratamento precoces ajudam a reduzir esses riscos.
3. Como saber se a infecção é antiga ou recente?
Através da análise dos anticorpos IgG, IgM e do teste de avidez do IgG. Um IgM positivo com IgG de baixa avidez sugere infecção recente. Já um IgG positivo com IgM negativo e avidez alta indica infecção antiga. A interpretação desses resultados deve sempre ser feita por um médico. De acordo com o Ministério da Saúde, o acompanhamento especializado é essencial, principalmente nos casos de IgM positivo ou avidez baixa, para definir a conduta terapêutica adequada.
4. O bebê sempre nasce com sequela se a mãe teve toxoplasmose?
Não. Se a infecção for diagnosticada e tratada corretamente durante a gravidez, é possível evitar ou minimizar os danos ao bebê. Muitos recém-nascidos podem nascer assintomáticos, especialmente quando o tratamento foi iniciado precocemente.
5. É seguro tratar toxoplasmose na gravidez?
Sim. Os medicamentos utilizados são seguros quando prescritos por um especialista e o tratamento é cuidadosamente monitorado. A espiramicina, por exemplo, é bem tolerada e amplamente utilizada. Já a combinação com sulfadiazina e pirimetamina exige mais atenção, mas também é eficaz e segura sob supervisão médica.